Impacto da pandemia e do isolamento social
Confira aqui algumas reflexões desse momento que estamos passando
Por Celia Lima
O isolamento social durante a pandemia do Covid-19 tem sido marcado por diversas fases, mais ou menos comuns a todas as pessoas. Este artigo trata sobre como muitas pessoas reagiram emocionalmente ao isolamento social e ao impacto da pandemia. As próprias redes sociais trazem uma sequência de eventos que podemos seguir cronologicamente para caracterizar as fases pelas quais passamos.
Faxina, arrumação e um novo olhar para a casa
Num primeiro momento, quando foi indicado a necessidade de nos isolarmos, aparentemente não nos demos conta da gravidade da situação. Ficar em casa deu quase um gosto de “férias”. Mas como não era possível viajar, as férias forçadas levaram muitas pessoas a perceber que poderiam ter tempo para fazer coisas que nunca faziam por falta de tempo ou oportunidade.
Assim, num primeiro momento vimos muitas pessoas limpando a casa. Umas caprichando mais na faxina, arrastando móveis, tirando a poeira dos lugares mais escondidos e outras redescobrindo essa tarefa de limpar, já que suas diaristas também entraram em “férias”. Mas não há sujeira para tanta limpeza e logo a tarefa extenuante encontrou descanso na arrumação dos armários.
Arrumar armários significa também separar as roupas que já não se usa mais. E lá foram muitos a separar suas roupas antigas, largas ou apertadas, enchendo sacos para doação. Teve mesmo os que improvisaram um brechó nas redes sociais. Bem… isso durou pouco tempo, não se pode arrumar armários todos os dias.
No meio disso, tivemos o reencontro com o fogão: trabalhando em casa era preciso cozinhar. E várias pessoas se animaram e grudaram nos sites e programas de receitas, inventando pratos, sobremesas… até que chegamos na fase dos pães.
As páginas das redes sociais foram inundadas com fotos de todos os tipos de pães: de linguiça, de leite, pão doce, pão de mandioca… eram muitos pães. E como que por encanto, os pães sumiram.
Mas ninguém apenas limpa, organiza ou cozinha ao longo do dia.
Algumas pessoas continuaram trabalhando remotamente. Muitas adaptações a essa modalidade de trabalho foram necessárias. Talvez uma melhoria ou atualização em seus computadores, ou mesmo a aquisição de outro equipamento, já que as crianças passaram a ter aulas virtuais ao mesmo tempo em que seus pais trabalhavam.
Escolas fechadas e desgaste emocional
As escolas e os professores foram massivamente afetados com a necessidade de adaptação à nova realidade. Se ficou difícil para os pais monitorarem seus filhos diante das telas, imaginem para os professores que têm filhos! A imensa carga de trabalho e desgaste emocional ainda são imensos! Dar conta da casa, preparar aulas, dar aulas, cuidar dos filhos e suas aulas! Professores são praticamente ninjas e merecem nossa reverência!
As máscaras de proteção foram incluídas na rotina e várias pessoas passaram a produzir máscaras como forma de complementar a renda. Muitas pessoas tiveram seus salários drasticamente reduzidos e outras tantas perderam seus empregos.
Ficar em casa o tempo todo diante de um cenário pandêmico, ao contrário dos primeiros tempos, passou a ser opressor.
Os amigos já não se encontravam, as crianças não brincavam com os amigos, os idosos perderam a convivência com filhos e netos. As famílias passaram a conviver mais e as pessoas que moram sozinhas perderam a independência de poder encontrar pessoas para socializar.
Quem é essa pessoa na minha família?
Casais se deram conta do quanto estavam distanciados, de que não se conheciam tão bem como imaginavam. Pais e filhos estiveram muito perto: os pequenos num nível de exigência extremo e os adolescentes aborrecidos acirrando os conflitos.
Surgem os encontros virtuais, os aniversários virtuais, os botecos virtuais, que muitas vezes frustram as pessoas, especialmente as que não têm tanta intimidade com as ferramentas da tecnologia, do que promovem um encontro prazeroso de fato.
De toda forma, melhor assim, ainda de maneira precária, do que permanecer mais tempo sem poder ver, abraçar e confraternizar com a família e os amigos.
Crescem os tutoriais sobre como cortar os próprios cabelos, tingir, inundando as redes com situações cômicas e outras de sucesso. As “lives” sobre os mais diversos assuntos pipocam por todos os lados! A criatividade salvou muitas pessoas do tédio e dos medos.
Alguns núcleos familiares estreitaram o afeto, redescobriram as afinidades, foram criativos e pacientes. Outros descobriram que já não era mais possível continuar convivendo e o que já estava por um fio, desmoronou.
Uma espécie de luto
Ao longo de todo esse processo, sentimos como se tivesse sido arrancado de nós o que tínhamos como certo. Nossa rotina se esfacelou, tudo o que era conhecido nos nossos dias deu lugar a uma espécie de vazio estrutural: onde estão os amigos, meu trajeto até o trabalho, a vontade de chegar em casa e tirar os sapatos, o churrasco no fim de semana com a turma toda, as viagens nos feriados, estrear uma roupa nova, o almoço em família no fim de semana, as comemorações festivas…
O imprevisível ficou raro, os dias pararam de reservar surpresas e uma espécie de luto se instalou. E muitas pessoas ficaram sem chão sem saber como lidar ou o que colocar no lugar do que ficou para trás.
Ao lado de todas as questões individuais, a comunidade científica empenha todos os esforços no sentido de conter a pandemia ou encontrar uma vacina. É quando nos damos conta da infinidade de pessoas que entraram no modo “negação”.
Ignorar as recomendações do isolamento – a forma mais eficiente de evitar o contágio – é um fenômeno que tem o agravamento da situação potencializado. Nem as estatísticas que demonstram que a cada vez que se propõe o relaxamento o número de casos cresce são consideradas pelos que se negam a encarar os perigos do contágio.
Pudemos perceber quem cuida de si e dos outros e os que não cuidam de ninguém. Nem todos tiveram a oportunidade de ter informações claras a respeito das formas de contágio e transmissão. Essas pessoas só se deram conta quando um parente ou amigo acabou sendo internado ou faleceu.
A falta de orientação e até mesmo orientações mal dadas pelos órgãos competentes autorizaram as pessoas a agir como melhor lhes aprouvesse, dando vazão a toda sorte de palpites que só enfatizaram a natureza de cada um.
Cansamos de ver agressões e discussões dentro de mercados, nas filas, nas ruas, porque muitas pessoas ou são mal informadas, ou não respeitam as recomendações de isolamento e do uso de máscaras.
As teorias da conspiração provocaram surtos de xenofobia, escancararam a ignorância em vários países do mundo. Incentivaram a descrença na comunidade científica, deram vazão aos mais refinados absurdos, desde acreditar que medir a temperatura na testa era uma forma de invasão no cérebro das pessoas até induzir a descrença nas vacinas já comprovadamente eficazes no combate a doenças como sarampo, rubéola, poliomielite, difteria e tantas outras.
É compreensível que todos estejamos cansados de ficar em casa. É compreensível que o desejo de voltar à velha rotina esteja à flor da pele. Mas é fundamental que sejamos responsáveis. As atitudes inconsequentes diante desse vírus tão perturbador são irreversíveis.
Alguns contaminados não sentem nada, em outros a manifestação é suave, outros são acometidos de complicações difíceis e milhões já morreram.
O fato é que todos, sem exceção são potenciais vetores de transmissão e é aí que reside o senso de coletividade. Os que não se importam de contrair deveriam se importar em não transmitir, mas não é bem assim que acontece.
O isolamento social provocou muitos problemas emocionais, como depressão, crises de ansiedade ou síndrome do pânico. Não existe vantagem numa pandemia. Ilusão acreditar que as pessoas poderiam ter se tornado melhores por causa dela. Quem quer se tornar melhor não precisa de pandemia ou isolamento social em suas vidas. O que aconteceu e ainda acontece de fato é que, sob pressão, as pessoas revelam seu melhor e também seu pior lado.
Muitas pessoas se surpreenderam consigo mesmas, encontrando uma paciência e um respeito aos tempos das coisas, compreendendo sua impotência e aceitando a necessidade de mudança de hábitos.
É sempre bom ter consigo que nada fica do mesmo jeito para sempre. Nada! Os ciclos se desenvolvem e se fecham para dar início a novos rumos. Não acredito nesse conceito de “novo normal”, é apenas a vida que segue transformada, e desta vez seguirá de forma contundente. Saber esperar, nesse momento, é a maior virtude que podemos desenvolver em nós.
Psicoterapeuta holística com abordagem junguiana há mais de 30 anos e pós graduanda em Psicologia da Saúde e Hospitalar pela PUC-PR. Utiliza os florais, entre outras ferramentas como método de apoio ao processo terapêutico, como vivências xamânicas, buscando um pilar metafísico para uma compreensão mais ampla da vida, da saúde física e emocional.
Saiba mais sobre mim- Contato: celiacalima@gmail.com