O que uma doença pode nos ensinar?
Observar o que nos adoece e respeitar o processo de cura propicia lições valiosas
Por Celia Lima
Só mesmo quando adoecemos é que entendemos o valor daquela expressão “tendo saúde, o resto a gente enfrenta”. Ora, se uma simples dor de cabeça já incapacita tantas pessoas para o cumprimento de tarefas cotidianas, imagine uma doena mais grave ou crônica, que nos obrigue a ficar na cama ou a mudar completamente os nossos hábitos!
A doença física é um tormento, sem dúvida. De uma gripe que agride o corpo todo com dores, tosse, congestão nasal e febre, ou uma gastrite que, além de causar dor, limita a nossa alimentação, passando pelo diabetes, que exige uma dieta adequada e medicação pela vida inteira, até os problemas que impedem nossos movimentos livres – seja temporariamente, como no caso de uma fratura, seja por uma doença crônica, como artrite, artrose ou problemas na coluna -, adoecer é sempre perturbador. O fato é que dificilmente encontraremos alguém que nunca teve um resfriado ou um problema de saúde que não o fizesse lembrar de que ele tem um corpo, e de que esse corpo precisa de cuidados que vão além da estética ou da prevenção de doenças. Em algum momento adoecemos, tanto por causa de uma doença corriqueira quanto devido a um problema mais grave.
Sintomas e doenças podem ser reflexos do nosso comportamento
Ouço muitas pessoas dizerem “eu fiz essa doença em mim”. É certo que a forma como lidamos com os acontecimentos em nossas vidas pode desencadear sintomas físicos e até mesmo certas doenças.
Uma pessoa não tem uma gastrite gratuitamente; certamente ela “engole” situações que lhe provocam dor, situações de difícil digestão.
O mesmo ocorre com quem tem dor de garganta frequentemente ou problemas de tireoide. Essa pessoa pode estar cheia de “sapos” atravessados na garganta, pode não conseguir expressar seus sentimentos de maneira adequada ou ainda pode estar bloqueando a própria expressão criativa. Claro que não existe uma cartilha que relacione de forma rígida a doença com o estado emocional que a provoca. É preciso conhecer o histórico da pessoa. Mas é certo que as doenças estão intimamente relacionadas ao nosso estado de alma.
Porém, saber disso não deve ser um elemento a mais para nos sentirmos mal. Muitas pessoas se culpam terrivelmente ou culpam outras por terem atravessado momentos emocionalmente delicados, acabando por creditar suas doenças a tais eventos de forma tão contundente que não percebem o quanto a culpa e a raiva podem estar dificultando a sua recuperação.
É sabido que as emoções podem interferir na nossa saúde física. Mas é igualmente importante aprender a lidar com essas emoções quando o corpo já está doente. É praticamente impossível ficarmos constantemente atentos ao nosso estado emocional, ainda mais com o objetivo de evitar a doença física. Não temos superpoderes, pelo contrário – somos vulneráveis, somos humanos.
Sentimento de culpa apenas dificulta o processo de cura
A doença é, de fato, mais um caminho para o autoconhecimento. Mas não é correndo atrás das causas psicológicas, emocionais ou afetivas que faremos com que ela desapareça, como por encanto. Melhor é, enquanto se está doente, que as energias sejam dirigidas ao processo da cura física, obedecendo às orientações médicas, aceitando o carinho e a atenção das pessoas queridas e percebendo conscientemente as próprias limitações. Ao aceitar o próprio estado temporariamente limitado, ao invés de esbravejar contra a doença, contra si ou alguém, você tem a oportunidade de dedicar-se a si mesmo, no momento presente, iniciando então o processo de cura. A aceitação e o reconhecimento da necessidade de ajuda acionam no doente a coragem para enfrentar o problema.
Sim, existem doenças que não têm cura, mas têm tratamentos que possibilitam uma qualidade de vida bem perto do desejável, em função das circunstâncias. Nesse caso, aquietar os pensamentos e entregar-se resignadamente ao tratamento são os primeiros passos para seguir em rumo a um estado mais amoroso em relação a si próprio.
Viver da melhor forma possível com um problema de saúde deve ser o objetivo de todos os que se defrontam com uma situação difícil.
Assim, eliminar a própria culpa por estar doente é fundamental para a recuperação. É preciso compreender que se você não lidou de outra forma com os eventos da vida que o levaram a adoecer, foi porque naquele momento não tinha maturidade suficiente para agir de outra maneira. É a experiência de vida que nos traz lucidez.
Da mesma forma, responsabilizar outra pessoa pelo advento da doença não vai ajudá-lo em nada na sua recuperação. Buscar do lado de fora os motivos que o levaram à tristeza, à raiva ou ao arrependimento é útil apenas para que você saiba que, afinal, tudo aquilo não tinha a importância imensa que você deu, ou que você estava completamente impotente com relação às atitudes do outro. Você não tem o controle sobre o outro! Aliás, abandonar o controle é de grande ajuda para viver mais suavemente. Controlar é uma ilusão.
Identificando e transformando atitudes nocivas à saúde
Ao adoecer, busque orientação profissional o mais rápido que puder. Faça sempre exames de rotina e não acredite que você está imune a doenças, porque não está. Se possível, escolha um médico que lhe transmita confiança, com quem você se sinta confortável para falar sobre seus medos e dúvidas. Pergunte tudo o que quiser – o profissional está ali para esclarecer e te ajudar. Mas, acima de tudo, procure focar no momento presente, que é o que exige a sua atenção. Seja generoso consigo mesmo, tendo paciência com o tempo necessário ao tratamento, e, fundamentalmente, não se torture com culpa ou outros sentimentos que não lhe serão nada úteis enquanto estiver se tratando.
Aceite ajuda, aceite companhia, aprenda a pedir.
No momento adequado você poderá recolher-se em reflexões e, aí sim, buscar novas formas de agir, de modo a cuidar das suas emoções em função das experiências que já viveu. Em suas reflexões você poderá reconhecer o que precisa deixar para trás, do que precisa desapegar-se e de que forma mais branda, amorosa, acolhedora e gentil pode presentear-se todos os dias.
Não ficamos doentes por acaso, mas a doença física possibilita o exercício do autoconhecimento, para revermos o nosso jeito de viver a vida e promovermos mudanças em nossas atitudes, especialmente as que nos afastam de quem verdadeiramente somos.
Psicoterapeuta holística com abordagem junguiana há mais de 30 anos e pós graduanda em Psicologia da Saúde e Hospitalar pela PUC-PR. Utiliza os florais, entre outras ferramentas como método de apoio ao processo terapêutico, como vivências xamânicas, buscando um pilar metafísico para uma compreensão mais ampla da vida, da saúde física e emocional.
Saiba mais sobre mim- Contato: celiacalima@gmail.com