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Estresse prolongado: Os efeitos além do burnout

O estresse prolongado em razão do distanciamento social e a falta de perspectiva de mudança está fazendo emergirem sintomas muito além da já conhecida síndrome de Burnout

Atualizado em

Você tem percebido alterações nos seus sentidos, queda de energia, desinteresse, falta de foco, sensação de estresse prolongado? Talvez você esteja com um conjunto de novos sintomas: o “definhamento”.

Desde novembro de 2020, após alguns meses de pandemia, atentei aos relatos dos clientes sobre sensações diferentes que não cabiam nas descrições de luto, tristeza, ou de outra emoção ou sentimento já conhecidos. É algo que vai muito além da Síndrome de Burnout.

As pessoas também não se sentiam deprimidas. Diziam dos afazeres cumpridos de forma automatizada, sem resistência, porém com alguma dificuldade de foco, até mesmo para ver um filme, embora reconhecessem sentir gratidão por estarem seguras e saudáveis. O neologismo “desvontade”, foi a maneira como uma cliente conseguiu traduzir o que sentia.

Está tudo bem, todavia não

Esta expressão nos auxilia nesta investigação. A vida está relativamente normal, o trabalho está lá, a família também, não falta alimento e abrigo, há preocupações naturais, que existem em razão do momento do mundo, mas, apesar de tudo parecer bem acomodado, pode acontecer um certo apagamento dos sentidos.

Alguns exemplos são um fastio da comida habitual, alteração na percepção das cores e uma dificuldade ou preguiça de falar, que interferem na qualidade de vida e nas relações, tendo como característica a sensação de falta de bem-estar.

Estas podem ser novas respostas do cérebro ao estresse prolongado e há pesquisas que apontam que o distanciamento social e a sensação de isolamento atuam drasticamente nas respostas ao estresse.

O que é o estresse prolongado?

A palavra estresse, em suas primeiras referências, denota à aflição e adversidade.

O médico endocrinologista Dr. Hans Selye definiu como “o resultado inespecífico de qualquer demanda sobre o corpo, seja de efeito mental ou somático, e estresseor como todo agente ou demanda que evoca a reação de estresse, podendo ser de natureza física, mental ou emocional”.

Na presença do estresseor, o corpo libera hormônios como o cortisol e adrenalina e as respostas orgânicas, já descritas pela ciência, são quatro:

  1. Lutar
  2. Fugir
  3. Congelar
  4. Desmaiar

Se luta, fuga ou desmaio, estes hormônios são usados e depois o repouso acontece.

No congelamento, uma resposta curiosa, há uma espécie de torpor, aquela categoria de coisa que ocorre quando se leva um susto ou quando recebemos uma notícia que nos deixa sem ação.

O estresse então é uma resposta natural, fisiológica e adaptativa na qual o organismo tenta retornar à homeostase, ou seja, encontrar o equilíbrio e sobreviver.

Fases do Estresse

A partir de estudos baseados em Selye (1965), Dra. Marilda Lippi (2000) propôs o modelo quadrifásico do estresse e apresenta os impactos na saúde em cada fase.

Na primeira fase do estresse, o alerta, há uma resposta saudável de adaptação, e podem ocorrer sintomas como dor de cabeça, pressão no peito e extremidades frias, mas brevemente tudo retorna ao normal.

Persistindo o estresseor, segue-se a segunda fase, a resistência, onde o organismo altera os parâmetros de adaptação, exigindo energia por mais tempo e nos deixando ansiosos e mais medrosos, com diminuição da libido, roendo unhas, denotando que a adaptação é mais difícil.

Com fatores estresseores persistindo em frequência e intensidade, na terceira fase, a quase exaustão, os motivos para a ação começam a ser “questionados” pelo sistema corpo-mente. É comum verificar um estado de energia depressiva, que pode ser identificado pelas respostas alteradas dos sistemas de base: fome, sede, sono, sexualidade, também afetando o sistema imune, com o surgimento de alterações na saúde marcadas pela mudança do metabolismo e sistemas cardíaco e respiratório.

Se os estresseores são contínuos e sem estratégias para lidar com o estresse, o organismo exaure sua capacidade adaptativa e a quarta fase, de exaustão, acontece. Aqui é onde ninguém quer chegar, o Burnout.  Nesta fase, órgãos e sistemas vulneráveis darão sinais mais intensos, apresentando problemas de saúde mais sérios. A depressão, neste caso, pode ser um sintoma relacionado.

É comum que as pessoas nesta fase apresentem traços de muito cansaço, sem conseguir reparo, mesmo descansando. É como se o alarme nunca desligasse e alterações químicas no cérebro exigessem atenção multidisciplinar, pois se trata de toda a complexidade humana sendo desafiada para retornar ao equilíbrio homeostático.

Por que zebras não tem úlceras?

livro por que as zebras não tem úlceras?Em seu famoso livro “Por que zebras não tem úlceras?” o biólogo e neurologista Robert M. Sapolky discorre sobre as teorias para lidar com o estresse, argumentando que os seres humanos são programados para se preocupar — literalmente pré-ocupar. Por isso, continuamos a sofrer os efeitos dos problemas, mesmo depois que eles acabam.

Zebras e todos os outros animais descansam após exposição ao fator estresseor. Os outros animais são assim: eles não “pensam” no amanhã.

Nós somos equipados com um cérebro que tem a tendência fisiológica de prescrutar o futuro, com o objetivo de desenvolver recursos para sobreviver.

Esta capacidade preditiva também nos traz a sensação de bem-estar quando sentimos ter o controle das situações, o que envolve a expectativa de finalização das tarefas e pressões.

E quando não há expectativa de terminar o Burnout?

Em um relato, o sociólogo Corey Keyes descreveu “definhar” como sendo a sensação de estagnação e vazio, configurando a ausência de bem-estar, mesmo diante de situações que antes trariam prazer e preenchimento.

De acordo com Keyes, o perigo é quando não se consegue perceber o próprio sofrimento e a busca de ajuda não acontece.

A exposição prolongada aos fatores provocados pela pandemia está trazendo outra resposta, muito além da Síndrome de Burnout.

Tudo o que o cérebro faz é para se adaptar e garantir a sobrevivência.

Apreendemos o mundo através dos nossos sentidos, que funcionam como filtros. Muito do que chamamos de preferências e escolhas são detalhadas instruções bioquímicas do cérebro e seu especializadíssimo sistema de adaptação para sobrevivência. Desta forma, podemos ficar tristes e melancólicos, desde que nos mantenhamos vivos.

Estas novas formas de sentir são tão recentes quanto viver no mundo ameaçado por uma pandemia. Ao mesmo tempo que essas “novas formas” cobram por serem reprogramadas, não há conclusões. É provável que nosso sistema de adaptação esteja, agora mesmo, desenvolvendo novas estratégias de sobrevivência para um ambiente e formas de relacionamento inéditos.

O termo “desvontade” jogou luz nestes sentimentos e sintomas, indefiníveis por hora, mas perturbadores por ainda não terem sido compreendidos.

O que fazer para lidar com o estresse prolongado?

Enquanto o mundo gira, entendendo que temos um cérebro preditivo, portanto, criativo, e podemos utilizar essas mesmas capacidades para treinar os sentidos em direção ao sentimento de bem-estar.

Já pensou em sentir o gosto do azul? O aroma da lua? O som de uma flor? A textura de uma música?

Muito além de uma brincadeira, estes exercícios ajudam o cérebro a construir novos caminhos neuroplásticos, movimentar a energia criativa, circular o qi vital, facilitar o equilíbrio entre os hemisférios cerebrais e trazer a sensação de novos espaços internos, dentre outras possibilidades. Quanto mais opções criativas, melhores adaptações podemos fazer.

Vivemos uma mistura de emoções que são submetidas ao nosso aspecto mais analítico, que julga, rotula e racionaliza, já que tudo precisa fazer sentido. No entanto, aposto no poder da subjetividade, da criatividade e, além de exercitar e desafiar os cinco sentidos, sugiro a leitura de Julia Cameron em “O Caminho do Artista” e Elizabeth Gilbert em “Grande Magia”.

No cordão dos criativos está também o Dr. Amit Goswami, abrindo novas perspectivas em “Criatividade para o Século XXI” e a Dra. Kelly McGonigal em “O Lado bom do Estresse”.

Em comum, todos eles apontam que viver criativamente é um modo que é mais movido pela curiosidade do que pelo medo.

Vale também fazer avaliação dos níveis de vitaminas e minerais essenciais, pois na presença de estresse prolongado o organismo fica desbalanceado. Esta avaliação é individual e deve ser feita por profissional habilitado. Não vá tomar complexos vitamínicos que podem causar danos à sua saúde, se não for corretamente indicado.

Super Cérebro

“O seu cérebro contém cerca de 100 bilhões de células nervosas que formam cerca de trilhões de conexões chamadas sinapses. Estas conexões estão em constante estado de remodelamento, respondendo ao mundo a sua volta. Como uma maravilha da natureza, minúscula e estupenda… Ficamos todos maravilhados com o cérebro, uma vez chamado: o universo em 1,5 quilos” Chopra & Tanzi – Super Cérebro.

Se a “desvontade” ou definhamento passarem por aí, talvez não seja um diagnóstico clássico, mas a experiência difícil de adaptação, pois junto da pandemia temos nossas vidas e questões pessoais no cenário.

Busque se informar e tome responsabilidade por sua saúde, procurando apoio para mais este capítulo da jornada, e tire proveito da criatividade, que é um presente da natureza para o ser humano.

Celia Barboza

Celia Barboza

Terapeuta Integrativa, Celia Barboza é certificada em BodyTalk Sistem, Master em Programação Neurolinguística, Consteladora, integrando outros saberes filosóficos para uma abordagem terapêutica profunda.

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