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Decepção: como lidar com a dor da expectativa frustrada

Conheça caminhos para sair da posição de vítima e apaziguar o coração

Atualizado em

Uma das principais causas da dor emocional é a decepção. Talvez seja uma das dores mais intensas, porque ela deriva das expectativas que depositamos em pessoas nas quais confiamos, de quem gostamos e de quem esperamos lealdade, fidelidade e um tratamento justo.

A decepção pode levar a um estado de inconformismo tão grande que o indivíduo pode passar anos da sua vida obcecado em encontrar razões pelas quais foi traído em seus sentimentos mais sinceros. Quer a qualquer custo entender por que alguém em quem depositava tanta confiança acabou agindo de maneira a destruir, a macular todo o bom sentimento que o ofendido lhe tinha. E toda uma história de bem-querer fica comprometida, dando lugar a um sentimento grave de injustiça. É como se algo morresse dentro de si.

Desilusões podem mudar para sempre a personalidade de uma pessoa

São inúmeras as razões que provocam a decepção, e as consequências podem comprometer a forma como a pessoa lida com as situações da vida:

  • Um filho que descobre que seus pais não são pais biológicos e que mantiveram segredo sobre a adoção pode se tornar uma pessoa desconfiada, retraída, insegura;
  • Alguém que sempre confiou que o parceiro jamais quebraria o acordo de fidelidade pode passar a ser infiel como forma de se vingar ou proteger de uma nova decepção;
  • O rompimento abrupto e sem explicações de um relacionamento que parece ir bem pode deixar alguém à deriva, suscitando muita raiva, por um lado, e muita culpa, por outro, paralisando quem foi deixado. Essa pessoa empregará muito tempo tentando encontrar as razões para aquela atitude;
  • O funcionário que acredita estar absolutamente dentro das regras da empresa e desempenhando bem o seu papel pode entrar num redemoinho de desilusão ao ser preterido numa promoção ou dispensado da empresa. Sem entender os motivos, pode deixar de acreditar que o seu empenho vale a pena;
  • Pais que acreditam terem feito seu melhor por um filho podem acabar vivendo mergulhados na culpa quando ele lhes dá as costas, indo viver em desacordo com toda a orientação que recebeu;
  • Filhos que foram parceiros de seus pais podem acabar num desapontamento profundo quando descobrem que eram alvo de fofocas e maledicências por parte dos mesmos. Aqui, a confiança desaparece, e o filho passa a temer ser apunhalado pelas costas por pessoas de quem é próximo.

Expectativas criadas, expectativas frustradas

Certamente todos já vivemos decepções, seja com os pais, os colegas de trabalho, um irmão, com amigos, com o companheiro, com um funcionário ou empregador, ou até com um político. Como disse anteriormente, a decepção existe sempre em função da expectativa que criamos em torno de alguém ou de uma entidade. Nem sempre percebemos conscientemente que criamos expectativas; o que ocorre é que esperamos do outro a mesma atitude que acreditamos que teríamos se estivéssemos no lugar dele.

O que perdemos de vista é que o outro não sou eu, não é você.

Muitas pessoas, com o intuito de se proteger, por exemplo, acabam tomando atitudes que ferem outras, e essas, por sua vez, vão se desapontar porque não podem entender a mecânica do pensamento originado pela traição, maledicência, rompimento ou pela quebra de confiança. Mas isso não quer dizer que quem é vítima desse comportamento tenha que antes compreender, ao invés de ficar decepcionado. A decepção é praticamente inevitável em certos casos. Cada pessoa traz em sua história de vida uma série de conceitos e inúmeras crenças. Cada um tem um caráter e uma personalidade próprios, com maneiras singulares de entender a vida, e rege suas atitudes em função disso.

O que fazer quando a decepção acontece?

Deixar-se levar pelas dores que acompanham esse sentimento acaba gerando mais dor. Todas as atitudes que tomamos no calor de uma emoção contundente geralmente desemboca em arrependimento. Quem fica mergulhado na raiva ou na mágoa está transformando a dor em sofrimento. Quem deixa a revolta dizer que o outro ?merece? experimentar a mesma dor que causou, pode se deixar levar por uma atitude de vingança e não se dá conta de que acaba se igualando ao seu agressor.

Fazendo uma autocrítica, não escolhemos ficar na posição de vítima passiva e, ao mesmo tempo, podemos nos certificar de que não absorveremos uma culpa que não nos cabe. Como diante de um episódio que causa decepção ficamos tomados por mil perguntas sem respostas e por vários sentimentos desencontrados, o melhor é não fazermos absolutamente nada até que o primeiro impacto seja absorvido. Mais calmos, podemos começar por olhar para nós mesmos, tirando o foco da pessoa que nos decepcionou.

É bom percorrermos o caminho que nós trilhamos naquela relação – seja ela pessoal ou de trabalho – para avaliarmos o que, em nossas atitudes, pode ter provocado a atitude do outro.

É importante tentar tomar um distanciamento dos fatos, analisar a real importância que os envolvidos têm em sua vida, verificar se as suas angústias em mostrar que está sendo vítima de uma injustiça não passam pelo fato de querer preservar a imagem que você tem de si mesmo. Ao fazer isso honestamente, fica mais fácil decidir qual caminho tomar. Não tenha pressa – uma reflexão demorada é mais saudável que uma atitude impensada.

Caminhos para a superação

São várias as alternativas para apaziguar o coração, embora nem sempre todas elas sejam passíveis de se concretizar. Se for possível conversar com a pessoa que lhe decepcionou e se você entender que vale a pena resgatar essa relação, faça isso quando sentir serenidade suficiente. É seu direito perguntar ao outro as razões de sua atitude, é saudável revelar seus sentimentos. Mas se criar expectativas de um desfecho maravilhoso, correrá o risco de se decepcionar novamente.

Se preferir escrever sobre o que sente, faça isso. Mas leia e releia seu e-mail ou sua mensagem. Isso também lhe dará oportunidade de rever seus sentimentos e razões que lhe movem ao se dirigir à pessoa. É um exercício de autoconhecimento. Da mesma forma, não espere por uma resposta nem por pedidos de desculpa. Afinal, seu objetivo deve ser apenas revelar o impacto que o episódio teve em você. Essa pessoa pode não querer conversar com você, pode ser agressiva ao lhe receber, pode inventar desculpas por ter agido da forma como agiu ou pode, na melhor das hipóteses, refletir a respeito do que fez e eventualmente aceitar que não teve uma atitude correta.

Caso a ofensa tenha sido grave a ponto manchar sua reputação e lhe causar prejuízos pessoais ou profissionais, talvez caiba tomar providências jurídicas. Consulte um advogado e certifique-se de estar amparado pela lei. Paralelamente, cuide de seu bem-estar emocional.

Evite mandar recados, evite dizer como se sente em redes sociais. Essa atitude, além de imatura, não vai resolver suas questões.

Ninguém deve ser o porta-voz de seus sentimentos, e as redes sociais só servem para expor, não apenas a você mesmo, como outras pessoas, gerando desconforto e induzindo amigos ou colegas a tomarem partido de um ou outro. Se você está sentindo mágoa, se decepcionou com alguém, aja de forma franca, direta e discreta: o assunto não diz respeito a mais ninguém.

Os desdobramentos de um confronto magoado ou raivoso podem ser nefastos e não ter fim. Mas quando se dá tempo ao tempo até que a dor da decepção se acomode, ainda que o “agressor” feche as portas para um diálogo, o mais importante é que você esteja em paz com você mesmo. Não queira entender tudo caso não tenha a oportunidade de esclarecer, pois isso vai frustrar você. Talvez, ali na frente, você possa ganhar a compreensão de que, afinal, esse rompimento lhe foi benéfico.

Por outro lado, sempre existe a possibilidade de as portas estarem abertas para esclarecimentos e compreensão. Quando as pessoas se desarmam, as chances de retomarem – se assim desejarem – são sempre maiores e mais promissoras. Caso algo tenha se quebrado na relação em função da decepção, ainda que haja o diálogo esclarecedor, restará o alento de mais um aprendizado.

Celia Lima

Celia Lima

Psicoterapeuta holística com abordagem junguiana há mais de 30 anos e pós graduanda em Psicologia da Saúde e Hospitalar pela PUC-PR. Utiliza os florais, entre outras ferramentas como método de apoio ao processo terapêutico, como vivências xamânicas, buscando um pilar metafísico para uma compreensão mais ampla da vida, da saúde física e emocional.

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