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Permita-se ficar triste

Não confunda tristeza e depressão. Identifique as diferenças.

Atualizado em

Outro dia estava em uma loja de conveniência e escutei duas adolescentes conversando. Uma delas falava como estava deprimida, pois seu animal de estimação havia morrido no dia anterior. Como psicólogo, aquela fala me chamou a atenção, principalmente o fato de a menina ter usado a palavra deprimida e não a palavra tristeza. Esta situação me fez pensar: quando é que podemos falar que estamos deprimidos e quando estamos tristes, de fato?

Atualmente, os termos depressão e tristeza parecem ser quase sinônimos. Observamos que as pessoas tem uma tendência de se autoproclamarem deprimidas, como se fosse vergonha dizer que se sentem tristes. Por que isso?

Vivemos em uma sociedade do espetáculo (expressão criada pelo pensador francês Guy Debord, em 1968) onde a vida real é pobre em termos objetivos e subjetivos. A mídia televisiva, principalmente, por meio das novelas e programas de auditórios, cria um ambiente e personagens perfeitos onde todos são lindos, magros, ricos, inteligentes, bem sucedidos, etc. Sabemos que na vida real, a maioria de nós não consegue alcançar este ideal de perfeição e o fato de não conseguirmos dar conta dessa demanda gera doenças emocionais, como a depressão, os transtornos alimentares, a vigorexia (compulsão por exercícios físicos), entre outros.

Em uma sociedade onde não podemos ficar tristes (pois necessitamos ser fortes, corajosos e felizes todo o tempo), somente nos é permitido expressar nosso descontentamento com as dificuldades que a vida nos impõe, adoecendo ou achando que estamos doentes. Daí esta ser uma possível explicação, para as pessoas confundirem tanto a depressão com uma tristeza.

Podemos afirmar que a tristeza é pontual, geralmente, decorrente de uma perda real ou simbólica de um parente (por exemplo, um filho que foi morar no estrangeiro), um amigo, um animal de estimação ou mesmo a perda de um emprego. Quando estamos tristes, na maioria das vezes, identificamos com clareza o motivo de nossa tristeza. É um estado que costuma durar alguns dias ou até aproximadamente dois meses, tempo necessário para elaborarmos esta situação de perda.

A depressão e seus estados depressivos são bem diferentes. Pode estar contida ou não uma sensação de tristeza, contudo, ela é uma sensação difusa. Não sabemos exatamente, porque estamos tristes. Dormimos muito ou pelo contrário, dormimos pouco, não temos apetite ou comemos em demasia. Sentimo-nos apáticos, sem energia para realizarmos nossas tarefas cotidianas ou nos sentimos sobressaltados e muito ansiosos.

Geralmente, quando nos sentimos assim, por mais de 2 meses e percebemos que aquilo que antes sempre realizávamos com facilidade e prazer, passa a ser realizado com dificuldade, esforço e sofrimento, então é hora de pensar em buscar uma ajuda médica e psicológica. Quando este quadro de sensações e sintomas começa a atrapalhar nossa vida social e nossa capacidade laborativa e criativa, então é importante acendermos nosso sinal vermelho, de que algo não vai nada bem.

A depressão, muitas vezes, surge em decorrência de múltiplos fatores externos (por exemplo, muita pressão no trabalho, aliado a preocupações com os filhos, com a própria saúde, questões antigas que estão mal resolvidas e que vem à tona por diferentes motivos) e internos. Por isso, é responsabilidade do psicólogo avaliar junto com o cliente a necessidade de buscar ou não um suporte médico e tomar uma medicação para ajudá-lo a sair da depressão.

Nos casos graves de depressão, esta “dobradinha” costuma dar muito certo. Nos casos mais leves, muitas vezes a psicoterapia por si só, dá excelentes resultados. É através da psicoterapia que o cliente vai reconhecer e identificar os fatores de perturbação emocional. Assim, poderá fazer os ajustes necessários em seu cotidiano, elaborar e dar um novo significado àquilo que gera desequilíbrio em sua vida.

Nos casos de tristeza profunda, a psicoterapia pode servir como um tratamento preventivo, para que possamos elaborar e resignificar uma determinada perda em nossas vidas. A capacidade de nos sentirmos tristes é um sinal de saúde.

A capacidade de nos sentirmos tristes é um sinal de saúde.

A capacidade de nos sentirmos tristes, de fazermos contato com as nossas dificuldade e tristezas, sem necessitarmos nos anestesiar com drogas legais (incluímos aí o uso abusivo de tranqüilizantes) ou ilegais, como uma maneira de tamponar a dor e o sofrimento, é um sinal de saúde. Como vivemos em uma sociedade em que as pessoas parecem estar muito desconectadas de si mesmas, poder identificar e reconhecer seus sentimentos bons e ruins é o primeiro passo para se buscar uma maior qualidade de vida.

Despertando para uma vida com mais saúde mental, emocional, física e espiritual:

Procure fazer contato com si mesmo: Quais são as suas características positivas e negativas?

Integre de maneira consciente seus pontos fortes e fracos: O que posso melhorar? Quais são meus limites?

Tente distinguir quando está triste com alguma coisa e quando está com risco de desenvolver um quadro depressivo. Sua tristeza tem um motivo? Como andam seu sono e apetite?

Rodrigo Garcez

Rodrigo Garcez

Psicólogo Clínico formado pela PUC-RJ e com especialização na Assistência e Atendimento ao Usuário de álcool e outras drogas pelo PROJAD/Instituto de Psiquiatria da UFRJ.

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