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Por que ter cuidado com significados prontos para sonhos?

Entenda como observações e impressões do sonhador fazem diferença na interpretação

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Ao longo do desenvolvimento da consciência humana, os sonhos sempre foram fenômenos fascinantes e misteriosos para a psique em formação. Eles permeiam a vida de todos os mamíferos saudáveis e também das aves. Para nós, humanos, eles possuem funções fisiológicas e psicológicas bastante importantes, como consolidação de memória, nos processos de aprendizado, mudança de atitudes conscientes, regulação da energia psíquica, exercício da criatividade, etc.

Infelizmente, numa cultura que busca por comodidades e soluções rápidas, os sonhos também foram engolidos por ela. A busca por respostas simples, instantâneas e reduzidas simplesmente não condiz com a natureza complexa e pessoal dos sonhos.

A busca por respostas simples, instantâneas e reduzidas simplesmente não condiz com a natureza complexa e pessoal dos sonhos.

Diversos são os sites que hoje oferecem pretensos significados que, não raro, conduzem os sonhadores a perspectivas equivocadas e rasas sobre si mesmos, afastando-os da possibilidade criativa que é a amplificação do sonho.

Ora, se o sonho é algo íntimo e majoritariamente pessoal, não faz qualquer sentido crer que há uma resposta pronta, padronizada e que sirva para todo mundo. Embora haja símbolos que possam ser considerados universais, como a mãe, a criança, o velho e o herói, a perspectiva do sonhador jamais pode ser descartada. Símbolos não têm o propósito de serem encerrados num único sentido possível, pelo contrário, seu propósito é ampliar as perspectivas do sonhador sobre seu próprio funcionamento psíquico.

Por que não devemos reduzir os sonhos a significados fixos?

Para responder a essa pergunta é importante compreender dois conceitos: arquétipo e símbolo.

Jung define arquétipos como potencialidades herdadas e constituídas por todas as experiências humanas possíveis, desde seus primórdios, e que influenciam o pensar, sentir e agir dos seres, isto é, são formas a serem preenchidas. O conteúdo fica por conta dos símbolos que rechearão o arquétipo com imagens, comportamentos e ideias.

Os arquétipos não podem ser vistos pelo que são, pois são exclusivamente potencialidade. Mas os símbolos podem ser perfeitamente identificados e vividos. Enquanto os arquétipos estão no inconsciente coletivo e são universais, pertencendo a toda humanidade, os símbolos são a linguagem acessível à consciência de cada indivíduo, portanto, ele confere ao inconsciente universal invisível (arquétipo) uma representação visível e acessível à consciência de cada indivíduo (sonho). Ele é a ponte entre o universal e o individual. O arquétipo fornece a forma, o símbolo fornece conteúdo.

Por essa razão, cada indivíduo sonha e não há apenas uma pessoa que sonhe por todas. Os arquétipos do inconsciente coletivo também são a forma dos aspectos que se desenvolverão no inconsciente individual, como complexos, defesas, sombra, etc., adquiridos a partir de vivências pessoais. E os sonhos tratam, em sua maior parte, desses aspectos. Nesse sentido, vai ficando mais claro que a pessoalidade do sonho não diz respeito a todo mundo. Embora o arquétipo seja universal, a imagem do sonho carregará informações e afetos que serão específicos para aquela pessoa que está sonhando, referente aos aspectos de seu inconsciente pessoal.

a imagem do sonho carregará informações e afetos que serão específicos para aquela pessoa que está sonhando, referente aos aspectos de seu inconsciente pessoal

É um fato que há os chamados grandes sonhos ou sonhos arquetípicos que podem revelar questões coletivas na psique pessoal, mas estes não são a maioria dos sonhos e não eximem o sonhador de uma análise pessoal em primeira instância, já que o sonho irrompeu em sua consciência.

Concluímos que, de qualquer forma, o sonho sempre trará algo de muito específico para o sonhador que não poderá ser generalizado para todos os outros sonhadores e, por isso, a interpretação não é fixa, rígida e sim ampla, profunda e deve sempre considerar as observações e impressões do sonhador. Por isso, o glossário de verbetes do Personare conta com perguntas. São elas a parte essencial de uma análise mais profunda e não as possibilidades interpretativas que oferecemos que servem ao propósito de contribuir com insights e não oferecer respostas prontas.

Confira aqui um guia para a interpretação dos seus sonhos

Um exemplo para facilitar o entendimento

Tomemos por exemplo o arquétipo da mãe: a maternidade é um acontecimento primordial. Todo mundo, para existir, precisou ter uma mãe. Entretanto, há tantas representações de mãe quanto existem mães, ou seja, a sua mãe, a mãe da sua mãe, Nossa Senhora, Iemanjá, Pachamama, Gaia, Deméter, a bruxa, a madrasta, a cova, a caverna, a vaca são todas expressões simbólicas do materno que podem ser positivas ou negativas. Não há um único símbolo que manifeste o arquétipo, mas pode haver um único arquétipo por trás de inúmeros símbolos.

Quando o sonhador sonha com sua mãe, ou com alguma mãe, ou com alguma forma de maternidade, o arquétipo em questão é o materno, mas a maneira como ele se apresentará simbolicamente é feita de maneira a mobilizar aquele sonhador especificamente.

Olhe para os sonhos como se fossem um teatro da sua personalidade

A melhor forma de olhar para um sonho é de maneira criativa, como uma história narrada da sua própria vida inconsciente, uma espécie de teatro dos aspectos da nossa personalidade. Observar os símbolos isoladamente pode fornecer insights, ideias e ampliações e, para isso, você pode acessar a base de dados de nosso glossário de símbolos, mas a totalidade do sonho é que permitirá observar a dinâmica que está se desenrolando no inconsciente.

É bom sempre lembrar que o sonho traz alguma informação que desconhecemos sobre nós mesmos.

E ela pode ser extremamente útil para mudarmos alguma atitude, para olharmos para algum assunto com mais atenção e até mesmo para observar nossa saúde, nosso corpo. Portanto, o sonho nunca está desconectado do nosso contexto pessoal, das nossas experiências e das nossas necessidades psíquicas e, por isso, os significados rígidos podem ser problemáticos, porque justamente estão descontextualizados.

É essencial se desapegar de respostas prontas quando o assunto é sonho. A informação mais importante é a interna, aquela que surge a partir das próprias observações e impressões, sentimentos e memórias do sonhador. As informações externas devem servir para enriquecer a análise e não formatá-la.

A psicoterapia, nesse sentido, pode ser um caminho valioso para aqueles que desejam se aprofundar na temática dos sonhos, já que este é um material incrível de registro desse processo e a troca com a terapeuta favorece enormemente a amplificação desses conteúdos.

Thaís Khoury

Thaís Khoury

É psicóloga clínica e utiliza a interpretação dos sonhos, a calatonia e a expressão criativa em seus atendimentos. Também é vegana e fundadora do Veganíssimo, empresa que produz alimentos 100% vegetais.

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