Manual de sobrevivência do pós-parto
Muito mais do que a cicatriz do parto, uma mãe tem de curar as feridas emocionais que nascem junto com seu filho
Por Alice Duarte
O corte da cesárea ou da episiotomia (aquela feita em alguns casos de parto vaginal) pode até estar bem cicatrizado na consulta de 40 dias pós-parto com seu obstetra. Mas as feridas emocionais deflagradas durante a gestação e o parto muito provavelmente ainda estarão abertas. E permanecerão assim para muitas mulheres-mães por meses e até anos.
Além da exaustão física e mental causada pela brusca mudança na rotina de cuidados intensivos com o bebê e da grande oscilação hormonal (que deixa a pior TPM no chinelo!), a mãe frequentemente se perde no labirinto de sentimentos estranhos, intensos e, muitas vezes, ambíguos.
A seguir, entenda o que acontece com uma recém-mãe e dicas de como enfrentar esse momento tão especial e doloroso ao mesmo tempo.
Emoções pós-parto
Uma mãe sente felicidade com a chegada de seu filho, mas também uma tristeza em ver morrer parte de quem era e da vida que tinha antes da maternidade. Esse luto é necessário, mas frequentemente nega-se essa tristeza, pois se romantiza demais a maternidade.
A mãe não pode falar que está difícil, porque “filho é uma bênção” e ela se sente obrigada a ser feliz.
Com a ruptura do corpo físico durante o parto, abre-se também uma fenda no inconsciente da puérpera, por onde saem velhos fantasmas, traumas e antigos assuntos dolorosos e mal processados.
É o que a renomada psicoterapeuta Laura Gutman chama de “encontro com a própria sombra“.
Nesse labirinto de emoções fortes e difíceis de lidar, há ainda a fusão emocional que a mãe estabelece com o bebê. A criança é parte de seu corpo, principalmente nos primeiros três meses, chamados de exterogestação.
Toda a confusão e dificuldades de adaptação ao mundo externo sentidas pelo bebê, a mãe também sente, a ponto de não saber o que é dela e o que é dele.
Nessa conta, soma-se ainda o sentimento de frustração pelas dificuldades que teve no parto, na amamentação, em aceitar o novo corpo e em voltar ao trabalho.
E embora esteja sempre acompanhada de seu bebê, o sentimento de solidão e isolamento é, muitas vezes, devastador, mesmo com rede de apoio por perto.
Afinal, até o direito de ir e vir fica comprometido. Sair com bebê de casa para qualquer lugar, mesmo que seja na esquina, se torna uma tarefa complexa. E a mãe é a única pessoa capaz de fazer certas coisas, como amamentar, por exemplo.
Tudo isso ganha lente de aumento pela privação de sono, que dura semanas, meses e até anos. Uma mistura potente que ameaça a saúde mental da mãe.
Manual de sobrevivência do pós-parto
Autocuidado
É muito fácil se perder nas tarefas exaustivas. Muitas mães mal conseguem tomar banho e escovar os dentes. Quem dirá cuidar da saúde mental e buscar terapia!
No entanto, o que deve valer é a lei da máscara de oxigênio: primeiro eu me salvo, para depois poder salvar o outro. O bem-estar do bebê depende de uma mãe equilibrada, e esse olhar atento para a mãe, muitas vezes, precisa vir de fora.
A tristeza que a puérpera sente, chamada de Baby Blues, é normal e esperada. Isso deve ser respeitado por todos, e a mãe precisa de contenção emocional para poder sentir e expressar livremente esta emoção.
Terapia
Se faltam ferramentas necessárias para superar esta fase, busque ajuda terapêutica! A tristeza intensa e prolongada demais precisa ser acompanhada de perto por um profissional.
Não adianta dizer que “vai passar”. A depressão pós-parto é séria e precisa ser diagnosticada por um psiquiatra e acompanhada por um psicólogo.
Medicamentos são necessários em muitos casos, e o ideal é que o tratamento seja complementado com outros recursos terapêuticos que ajudam a regular as emoções, como Florais de Bach, Aromaterapia, entre outros.
A Constelação Familiar, por exemplo, ajuda a diagnosticar a origem da depressão, no que ela se conecta, e com isso libera ressonâncias de sofrimentos e traumas do passado, às vezes transgeracionais.
Rede de apoio
Mais importante que montar o enxoval do bebê durante a gestação é ir montando uma rede de apoio que ajude de verdade. Ou seja, a mãe precisa ser cuidada e apoiada para que ela possa apoiar o seu bebê.
Tenha uma conversa franca com seus familiares e amigos e explique o que realmente necessita e como gostaria de ser ajudada.
Ter alguém que faça as compras de mercado, que cozinhe ou leve comida pronta para você, que faça uma faxina semanal na sua casa ou que fique uma horinha com seu filho para que possa tomar um banho com calma ou recuperar parte da noite mal dormida é um presente que toda puérpera precisa nesta fase.
Alice Duarte é facilitadora de Constelação Sistêmica Familiar e Organizacional, com treinamentos internacionais com o alemães Bert e Sophie Hellinger, e os espanhóis Joan Garriga e Brigitte Champetier de Ribes. Desde 2015 facilita processos de autoconhecimento, cura emocional e solução de conflitos nos relacionamentos. É jornalista, mantém um site autoral com artigos em português e é criadora do programa online Por Uma Vida Sem Amarras. Vive em Curitiba, onde trabalha com grupos terapêuticos, workshops, cursos e atendimentos individuais (presenciais e online) de Constelação Familiar e Consultoria Sistêmica Empresarial. Aqui no Personare escreve sobre autoconhecimento e relações humanas.
Saiba mais sobre mim- Contato: contato@aliceduarte.com
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